sexta-feira, 16 de março de 2012 0 comentários

O diretor e o ator.



Luz, câmera, ação! Grita o diretor no início de mais um dia exaustivo de gravação. Textos para serem decorados, maquiagem e todo um roteiro a ser seguido.

O diretor conversa com o seu ator principal, faz gestos, sinaliza sua posição na cena, o movimenta para a esquerda e para a direita, foca a intensidade da voz em dado momento do texto e o intérprete devota toda a sua atenção.

Toda a história já está escrita, o diretor conhece cada cena, cada pausa e respiração do ator. Sabe de forma antecipada cada expressão do seu rosto. Nada para ele é novidade.

O ator por sua vez se esvazia de si mesmo para encarnar um personagem. Usa técnicas de interpretação para vencer a dificuldade de torna-se outra pessoa, para fingir ser alguém que não é.

Ouve-se um grito no estúdio, a ira do diretor devido a um erro. Todos em silêncio. Para ser um ilustre vencedor da Academy Awards não pode haver tropeço algum.

Admito, sou um péssimo ator. O que não é novidade para muitos que me conhecem.
Porém, não nego a existência de um diretor que me acompanha diariamente.

Diferentemente de Alfred Hitchcock, Martin Scorsese ou Steven Spielberg, o diretor me convida para com ele escrever a história.

A novidade nos apanha a cada cena, a cada diálogo escrito por nossas mãos choramos ou sorrimos. Ele abriu mão de, antecipadamente, conhecer ou criar sozinho o roteiro de minha vida.

Quando erro e tento usar técnicas para ser outra pessoa ele simplesmente me convida para ser eu mesmo.

Não se ouve gritos de ira no estúdio. Somente uma doce voz que me chama para a vida. As câmeras não me filmam com lentes de julgamento, condenação ou humilhação.

Antes, são focadas na beleza, na essência do ser. Se algum defeito as embaçam num piscar de olhos tudo se torna límpido.

Minha esperança vai além de ser indicado pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, vai além de uma estatueta e reconhecimento. Devoto minha esperança no fim dos filmes que mostram a miséria, a intolerância e a guerra.
Mais uma cena está prestes a começar, mais um diálogo para ser escrito e o diretor tornou-se ator. Juntos desbravamos o desconhecido.

Ele nos convida a escrevermos um roteiro de vida baseado no amor, na aceitação e no perdão.

Então, pronto para começar a escrever a história?

Até o próximo roteiro!
segunda-feira, 12 de março de 2012 1 comentários

"Grávido"


Tenho vivido momentos angustiantes de dúvidas, incertezas e falta de fé. Às vezes sinto que algo no interior deseja brotar, transbordar e nascer para o mundo. Chego a conclusão que estou “grávido”.

Por vezes me senti estéril como Sara na poesia bíblica. Mas sem a promessa da gravidez na velhice.

Chego ao diagnóstico que minha gestação é de alto risco; Ruptura com o fundamentalismo, infertilidade da fé, má aceitação de verdades absolutas me advertem de um parto doloroso ou que não chegue ao seu fim.

Já sinto os olhares preconceituosos, o peso do julgamento já se torna quase insuportável e vozes que ecoam sobre a paternidade. “Não sabe ao menos quem é o pai” afirmam tais vozes.

Como no relato da “mulher adúltera” também desejam me apedrejar. Assumo a culpa. Nós últimos anos tenho partilhado meus lençóis com homens e mulheres. Afirmo: Não sei quem é o Pai.

Rubem Alves, Harold Kushner, Ricardo Gondim, Florbela Espanca, Cecília Meireles e Gabriel García Márquez são alguns dos que envolveram minhas noites com beleza, poesia e amor.

Dostoiévski, André Comte-Sponville e Albert Camus sitiaram meus entardeceres com torrentosos desejos, segredos e solidão.

Não sei quem é o pai, prefiro o mistério. Todos semearam e alimentarei cada filho com minha vida, dedicação e amor.

Já sinto as dores do parto, a bolsa gestacional estourou e agora sonho com seus nomes: Tolerância, Paz, Amor, Desejo, Mistério, Beleza...

Até a próxima gestação.
 
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