quarta-feira, 21 de março de 2012 0 comentários

Uma reflexão sobre a morte.


“Meu pai, se for possível, afasta de mim este cálice;” (Mt 26:19) Tornou-se o nosso clamor quando nos deparamos com a morte ou com o seu sopro em nossos pensamentos. Fugir de tal reflexão é o mesmo que fugir da vida ou da reflexão sobre o homem.

Elisabeth Kübler-Ross afirma: “Morrer é parte integrante da vida, tão natural e previsível quando nascer”.

Refletir sobre a morte é um repto para a filosofia e também para a teologia. Nós, cristãos, mesmo aceitando uma vida após a morte, ainda a tememos. No campo da teologia tornou-se um problema da Teodicéia. Kierkegaard, teólogo e filósofo, indagou:

“Que divindade é esta, que, tendo criado o ser humano, deixa-o, depois, torna-se comida para os vermes?”

A nossa imagem da morte torna-se a nossa imagem de Deus. O medo da morte, para muitos, é o espelho do Deus punidor, vingativo e que os lançará no inferno.

Vencer a morte não é a nossa jurisdição. Aquele que poderia vencê-la já o fez. Dedicar-se à vida é liberta-se do medo da morte sem esquecer de que ela é intrínseca a condição humana.

Walter Rauschenbusch, em suas Orações por um mundo melhor, me fez chorar ao declarar:

“... somos como crianças, com medo do escuro e do desconhecido, e tememos deixar esta vida que é tão boa, e os nossos amados, que nos são tão queridos. Dá-nos um coração valente para que possamos caminhar por essa estrada com a cabeça levantada e um sorriso no rosto”.

Tempus Fugit - O tempo foge e sempre caminhamos para um fim. A vida e a morte se entrelaçam em nossos lençóis tornando-nos vulneráveis ao amanhecer. O brilho do Sol não mais te aquecerá, o perfume da rosas tu não sentirá, os lábios da tua amada tu não tocarás. - Carpe Diem!

Reflito sobre o que escreveu Rubem Alves: “Somente aqueles que se tornam discípulos da morte sentem a doçura da vida. Quem não é discípulo da morte fica sempre achando que ainda há muito tempo e, com isso, não se dá conta dos morangos que há à beira do abismo. Ele pensa que há um lugar onde se chegar. Não há. Todos os caminhos levam ao mesmo fim. Na vida só há o caminho...”.

Ouço a voz que diz: “segue-me”.
domingo, 18 de março de 2012 0 comentários

"géenna"



Longe dos centros urbanos, à margem de uma sociedade individualista, crianças, adolescentes e adultos se amontoam ao redor de uma nova carrada de lixo. Catam restos de comida que disputam com pássaros, ratos e criações de porcos.

O chorume, líquido natural do apodrecimento da matéria orgânica, escorre com seu odor nauseante e faz companhia as mães amamentando seus filhos.

A solidão de cada olhar, o choro gritante da criança, o sofrimento angustiante da mãe anunciam a morte da esperança. Uma infância perdida. Não sabem jogar bila, as meninas não pulam amarelinha e jamais dançaram ciranda.

No entardecer, o brilho do Sol se confunde com o fogo que queima com a geração do metano, as bactérias metanogênicas não cessam seu trabalho, o fogo jamais se apaga.

onde “o verme não morre, e o fogo jamais se apaga”. (Mc 9:48)

Estão condenados! Condenados por uma sociedade que assaltam sua dignidade e os lançam no “inferno” onde o ranger de dentes ecoam das crianças desnutridas, onde o choro nasce do coração do pai que não vislumbra o fim do sofrimento.

Tornamos-nos naquele que veio para matar, roubar e destruir. Somos demônios torturantes dos nossos próximos. Somos os que alimentam o fogo que os queimam sem piedade.

Abraço-me com o que afirma Marquês de Sade “Não há outro inferno para o homem além da estupidez ou da maldade dos seus semelhantes”.

Não quero perder a fé, não quero torna-me pessimista discípulo de Arthur Schopenhauer. Quero acreditar na salvação dos marginalizados, daqueles açoitados pela religião, dos que pedem um pedaço de pão, dos viciados no crack.

Quero manter a esperança de que ainda somos capazes de transformar os lixões em o Reino de Deus, que somos capazes de reciclar a dignidade humana, de reavivar a beleza escondida em meio à degradação.
 
;